022 – Costumes - B

Na sala do terceiro ano, o enorme Lica Messina brigou com pequeno Ivan Pires; o Ivan, apesar de pequeno e magro, era muito bravo, apontou o lápis, deixando-o com uma ponta bem comprida, e a fincou no braço do Lica. Durante anos o pedaço de grafite ficou no braço do Lica. Com sete anos, apavorei-me com a briga e até hoje me vem à cabeça. 

Às aulas, normalmente os alunos íamos descalços; interessante que, quando era necessário o uso do sapato e alguém estava com um dos pés machucado – muito comum entre os meninos – usava-o apenas no pé são.

- No início da aula cantavam-se o Hino Nacional e o Hino da Independência - musicado por D. Pedro I - além de rezar uma Ave Maria e um Padre Nosso – dizia-se Padre Nosso, pois Pai Nosso foi introduzido anos depois.

         - Depois da festa do padroeiro São Sebastião, a da Rainha do Congado era a maior do lugarejo – minha irmã Rose, a caçula, foi princesa. Lembro-me que fui à casa da D Jandira do Sô Messina, assistir a saída da rainha, a Maria Lúcia, sua filha.

- Fui a um piquenique, com a Dona Jandira e família, e alguns amigos, ao lado de uma lagoa depois da ponte de madeira sobre o Rio Doce. Ainda havia floresta fechada, mas já havia caieira para fazer carvão, inclusive com as mais nobres das madeiras, para os altos fornos das metalúrgicas da Belgo Mineira em Monlevade e Sabará. Dona Jandira abriu uma lata de ameixas pretas, coisa rara para mim, e apanhamos muitas castanhas, a saborosa sapucaia, da árvore debaixo da qual nós nos acampamos.

 

- A água usada era do Rio Piracicaba; o leite, quase sempre batizado com água do ribeirão mais próximo do curral, vinha em latas-de-leite, de uns trinta litros cada, dependuradas na cangalha de um burro; o leite retirado pelo leiteiro com um caneco feito com uma lata de uma conserva qualquer – na realidade de apenas 900ml, mas, como ainda hoje, considerada como de um litro. 

 

         - Fabriciano era o único lugar na região livre de muitas doenças, como a malária, febre amarela, tifo, barbeiro etc.. O Horto – Coigo de Nossa Sinhora - e Ipatinga, a região em geral, eram terríveis, tinham tudo de ruim: todas essas doenças e mosquitos, pernilongos e todo tipo de bicho, inclusive onças, cobras e jacarés. Em Monlevade, Vovô Pedro e um amigo enterraram noventa e oito dos cem operários contratados para a construção da linha férrea.

         - Meu irmão José Maurício quebrou um dos braços. O médico o encanou mal. Numa visita ao consultório, o médico viu o erro e resolveu consertá-lo: colocou o braço do José Maurício em cima da mesa, mandou-o olhar para o lado e, com uma marretada, tornou a quebrá-lo – apesar da tremenda dor, o conserto valeu a pena - pelo menos quebrar direito o médico sabia...

         - Papai dizia que os ossos do Darcy, meu irmão mais novo, eram de louça – quebravam à toa – viviam partindo por menor que fosse o tombo - sei lá quantas e quantas fraturas sofreu. Em compensação, após tantos tratamentos, seus dentes ficaram imunes às cáries por anos.

 

                   Benedito Franco

 

 

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